O Ataque dos EUA ao Irã em 2025 e a Força Política dos Aiatolás: Entenda o Regime Teocrático

Introdução: Como o Ataque dos EUA ao Irã em 2025 Expôs o Poder Político dos Aiatolás

Em 21 de junho de 2025, o mundo voltou seus olhos para o Oriente Médio. Os Estados Unidos lançaram uma ofensiva coordenada contra instalações nucleares iranianas, incluindo os complexos subterrâneos de Fordo, Natanz e Isfahan. A ação, justificada por Washington como uma resposta preventiva à crescente escalada do programa nuclear iraniano, reacendeu temores de um conflito de proporções regionais — ou até globais.

A reação de Teerã foi imediata: o presidente recém-eleito Masoud Pezeshkian prometeu represálias, enquanto o Líder Supremo, Aiatolá Ali Khamenei, convocou a nação à resistência e declarou que “a soberania do Islã não será submetida à força do Ocidente”. Nas ruas, manifestações tomaram conta de cidades como Qom e Teerã, com milhares de iranianos protestando contra o que chamaram de “agressão imperialista”.

Esse episódio, além de marcar uma virada na política externa do Oriente Médio, escancara uma questão que muitas vezes passa despercebida fora da região: quem realmente comanda o Irã? Em uma estrutura política híbrida, que mistura instituições democráticas com uma teocracia baseada no Islã xiita, a figura dos aiatolás — especialmente do Líder Supremo — se mostra decisiva.

Neste artigo, vamos compreender quem são os aiatolás, qual o papel deles dentro do xiismo duodecimano, por que eles ocupam posições de poder e como, em momentos de crise como o atual, essa autoridade espiritual se transforma em força política. Para entender o Irã de hoje, é essencial compreender a tradição religiosa e a construção histórica que colocaram os clérigos xiitas no comando de um dos países mais influentes da região.


Xiismo e Sunismo: A Divisão Inicial do Islã

Para entender o papel dos aiatolás no Irã e sua profunda influência até os dias de hoje, é preciso voltar ao ponto onde tudo começou: a morte do profeta Maomé, em 632 d.C. Naquele momento, o Islã ainda era uma religião jovem, mas já reunia uma comunidade crescente de fiéis na Península Arábica. O que estava em jogo, no entanto, não era apenas espiritualidade — era também liderança, organização e poder.

A dúvida que mudou a história islâmica

Com a morte do profeta, surgiu uma pergunta inevitável: quem deveria liderar a comunidade muçulmana? Maomé não havia deixado uma instrução clara e direta sobre quem seria seu sucessor. Isso abriu espaço para diferentes interpretações — e consequentemente, para a maior divisão da história islâmica: sunitas x xiitas.


A origem dos sunitas: a escolha pela comunidade

Um grupo, que mais tarde se tornaria a maioria e daria origem aos sunitas, acreditava que o novo líder — chamado califa, que significa “sucessor” — deveria ser escolhido pela própria comunidade de crentes. Para eles, a liderança era uma questão prática, não necessariamente hereditária. O escolhido foi Abu Bakr, sogro e amigo próximo de Maomé. Ele foi o primeiro de uma linha de califas que buscavam preservar a coesão política e religiosa da nascente comunidade islâmica.


O nascimento do xiismo: a liderança na linhagem do profeta

Já outro grupo entendia a sucessão de forma muito diferente. Para esses muçulmanos, a autoridade religiosa e política deveria permanecer na família do profeta, mais precisamente com seu primo e genro Ali ibn Abi Talib, casado com Fátima, filha de Maomé.

Esse grupo ficou conhecido como shiat Ali — ou seja, “os partidários de Ali”. A expressão, em árabe, daria origem à palavra “xiita”.

Mas essa não foi apenas uma divergência sobre quem deveria ocupar um cargo. Era, na essência, uma diferença profunda de visão sobre autoridade, legitimidade espiritual e como a mensagem divina deveria ser preservada.


Mais que política: a ruptura religiosa

Com o tempo, essas duas correntes foram se distanciando não apenas na forma de escolher líderes, mas também em doutrinas, práticas religiosas e interpretações do Alcorão. Os sunitas mantiveram a tradição dos califas como líderes da ummah (a comunidade muçulmana). Já os xiitas passaram a acreditar que a verdadeira orientação divina só poderia ser transmitida por descendentes diretos de Ali e Fátima, os chamados imãs.

Para os xiitas, esses imãs não eram apenas líderes políticos. Eles eram guias espirituais infalíveis, com um conhecimento especial da vontade de Deus — quase como faróis em meio à escuridão da história.


Hoje: maiorias, minorias e tensões duradouras

Atualmente, os sunitas representam cerca de 85% da população muçulmana mundial, enquanto os xiitas formam aproximadamente 15%. No entanto, essa minoria tem maioria em países estratégicos como o Irã, o Iraque e o Azerbaijão, além de possuir grandes comunidades em nações como o Líbano, Bahrein, Iêmen, Síria e Paquistão.

A tensão entre as duas vertentes não é apenas teológica — ela também se manifesta na geopolítica moderna, influenciando conflitos, alianças e disputas de poder no Oriente Médio e além.


Um Legado Que Ainda Ecoa

A divisão entre xiitas e sunitas não foi apenas um cisma histórico — ela moldou a trajetória de nações inteiras, afetou decisões políticas, provocou guerras e criou lideranças carismáticas como a dos aiatolás no Irã. Entender essa divisão é como abrir uma janela para o passado, mas também é essencial para compreender o noticiário de hoje.

Se você já se perguntou por que o Irã é tão diferente de outros países islâmicos, por que certos clérigos têm tanto poder ou por que o Oriente Médio vive crises recorrentes, tudo começa aqui — com uma sucessão não resolvida que mudou os rumos do Islã para sempre.

Quem São os Xiitas Duodecimanos?

Uma linhagem sagrada, um imã oculto e a base teológica do poder iraniano

Depois da ruptura entre sunitas e xiitas, a vertente xiita se desdobrou em diversos ramos ao longo dos séculos. Mas um deles se tornou dominante: o xiismo duodecimano — também conhecido como xiismo dos Doze Imãs. Hoje, essa corrente representa quase 90% de todos os xiitas no mundo, sendo a vertente oficial no Irã e extremamente influente no Iraque, no Líbano e em outras partes da Ásia e do Oriente Médio.

Uma fé alicerçada em doze nomes

Os xiitas duodecimanos acreditam que Deus escolheu doze imãs sagrados, sucessores diretos de Maomé por meio de Ali e Fátima. Esses imãs, segundo a crença, são infalíveis, justos e detentores de um conhecimento divino que vai além do entendimento comum. Eles não apenas preservam a mensagem original do Islã, mas também têm autoridade para interpretá-la à luz dos desafios de cada época.

A sucessão começa com Ali ibn Abi Talib, considerado o primeiro imã, e segue até Muhammad al-Mahdi, o décimo segundo e último da linhagem.


O Imã Oculto: Muhammad al-Mahdi e o conceito de “Ocultação”

Aqui entra um dos pilares mais intrigantes do xiismo duodecimano: a crença de que o 12º imã, Muhammad al-Mahdi, não morreu. Ele teria entrado em um estado de ocultação no século IX, desaparecendo fisicamente do mundo, mas permanecendo vivo de forma espiritual.

Segundo essa crença, sua ocultação menor durou cerca de 70 anos, durante os quais ele se comunicava por meio de representantes. Depois disso, ele entrou em um estágio de ocultação maior, que continua até hoje — e só será rompido no fim dos tempos, quando ele reaparecerá como um salvador escatológico para restaurar a justiça no mundo e liderar os fiéis contra a corrupção e a opressão.


A ausência presente: como os xiitas se organizam sem o 12º Imã

Mas se o guia supremo está ausente há mais de mil anos, quem conduz a comunidade xiita? A resposta é: os grandes estudiosos religiosos, homens profundamente versados no Alcorão, nos ensinamentos do profeta e nas tradições dos imãs.

Esses estudiosos são conhecidos como “marjá” (referências), e entre eles, os mais respeitados recebem o título de aiatolá — um “sinal de Deus” sobre a Terra. Eles assumem a responsabilidade de interpretar a lei islâmica (sharia), guiar espiritualmente seus seguidores e oferecer respostas às questões sociais, políticas e jurídicas da atualidade.


A raiz teológica do poder político

O xiismo duodecimano não é apenas uma teologia de devoção. Ele também contém um componente jurídico-político sofisticado, que foi sendo refinado ao longo dos séculos. A ideia central é que, enquanto o imã oculto estiver ausente, os juristas mais qualificados devem assumir seu papel interino de liderança. Essa noção foi transformada em doutrina oficial no Irã por Ruhollah Khomeini em 1979, sob o nome de “velayat-e faqih” — a tutela do jurista.

É por isso que, no Irã, o cargo mais poderoso do país — o de Líder Supremo — é ocupado por um aiatolá escolhido entre os mais altos clérigos xiitas. Ele não é apenas um líder religioso, mas também o guia político máximo da nação.


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Um sistema único no mundo islâmico

Diferente dos países de maioria sunita, onde religião e política geralmente seguem caminhos separados (ainda que influenciem um ao outro), no xiismo duodecimano — especialmente no modelo iraniano — fé e governo caminham lado a lado. A ausência do 12º imã não gerou um vácuo; ela criou uma estrutura complexa de liderança substitutiva, que mistura jurisprudência islâmica, misticismo e poder de Estado.

Por isso, entender quem são os xiitas duodecimanos é compreender a alma do Irã contemporâneo, suas escolhas políticas, suas respostas a ameaças externas e o motivo pelo qual, mesmo sob sanções, bombardeios ou pressões internacionais, o país segue sendo conduzido por figuras como o aiatolá Ali Khamenei — um líder religioso com poder de veto sobre tudo, do armamento nuclear à política cultural.


Aiatolás: Líderes Espirituais Durante a Ocultação do Imã

Durante a ausência do 12º imã, os xiitas passaram a se guiar por estudiosos religiosos altamente capacitados, que interpretam a lei islâmica (sharia) e orientam a comunidade. É aí que surge o título de aiatolá (em árabe, āyat Allāh, “sinal de Deus”).

Quem Pode Ser Um Aiatolá?

Um aiatolá é, em geral, um clérigo xiita que alcançou o mais alto grau de conhecimento na jurisprudência islâmica (fiqh) e na teologia. Para isso, o estudioso passa anos — às vezes décadas — em hawzas, centros de estudo religioso localizados em cidades como Qom (Irã) ou Najaf (Iraque).

Os aiatolás têm autoridade para:

  • Emitir fatwas (pronunciamentos legais islâmicos);
  • Interpretar a sharia;
  • Liderar espiritualmente seus seguidores;
  • Administrar instituições religiosas e seminários.

Alguns deles, os mais respeitados, recebem o título de “Aiatolá al-uzma”, ou “Grande Aiatolá”, que os coloca como referências religiosas para milhões de fiéis.


O Aiatolá e o Estado: A Revolução Islâmica do Irã

Até a década de 1970, o Irã era governado por uma monarquia laica liderada por Mohammad Reza Pahlavi, o Xá do Irã. Com forte influência ocidental, ele implantou reformas modernizantes e secularizantes que desagradaram parte significativa da sociedade, especialmente o clero xiita.

Em 1979, uma série de movimentos sociais, religiosos e políticos culminou na Revolução Islâmica do Irã, liderada pelo aiatolá Ruhollah Khomeini. Exilado por anos, Khomeini retornou ao país como herói revolucionário e transformou o Irã em uma república teocrática, baseada na doutrina da “Tutela do Jurista Islâmico” (Velayat-e Faqih).


Velayat-e Faqih: A Doutrina da Tutela do Jurista

Segundo essa teoria, enquanto o 12º imã permanecer oculto, o poder de governar deve ser exercido pelos mais sábios e justos juristas islâmicos — ou seja, os aiatolás mais qualificados. No Irã, essa ideia ganhou forma na figura do Líder Supremo (Rahbar), a autoridade máxima do país.

O Líder Supremo tem amplos poderes:

  • Comanda as Forças Armadas;
  • Nomeia chefes do Judiciário;
  • Supervisiona a mídia estatal;
  • Indica metade do Conselho dos Guardiões, que valida leis e candidatos políticos;
  • Tem poder de veto sobre decisões do parlamento.

Apesar de o Irã possuir um presidente eleito, parlamento e eleições regulares, todos esses órgãos estão subordinados à autoridade religiosa do Líder Supremo.


Quem É o Líder Supremo do Irã Hoje?

Após a morte de Khomeini em 1989, seu sucessor escolhido foi o aiatolá Ali Khamenei, que permanece no cargo até hoje. O Líder Supremo é escolhido por um órgão chamado Assembleia dos Peritos, composto por clérigos xiitas eleitos pelo povo.

Apesar das eleições e da existência de partidos políticos, o Irã é considerado uma república teocrática, onde a democracia funciona dentro dos limites estabelecidos pelos intérpretes da lei islâmica.


Aiatolás Fora do Irã: Uma Influência Global

Embora o modelo iraniano seja único, os aiatolás também desempenham papéis relevantes em outros países:

  • Iraque: a cidade de Najaf abriga grandes seminários e é a sede de figuras como o Grande Aiatolá Ali al-Sistani, respeitado por milhões de xiitas.
  • Líbano: o grupo Hezbollah segue a liderança espiritual de aiatolás, inclusive os iranianos.
  • Paquistão e Afeganistão: também contam com comunidades xiitas guiadas por clérigos locais.

Nesses países, a influência dos aiatolás é mais religiosa e social do que política, diferentemente do que ocorre no Irã.


Conclusão: Por Que Entender o Que é um Aiatolá Revela Muito Além da Religião

Entender o que é um aiatolá não é apenas mergulhar numa questão religiosa, mas sim compreender a engrenagem de um modelo de poder único e controverso, onde autoridade espiritual e controle político caminham juntos.

No caso do Irã, essa figura ultrapassa a esfera religiosa e se posiciona como símbolo de centralização extrema, com forte influência sobre a justiça, o exército, os meios de comunicação e até o processo eleitoral. Não se trata apenas de uma crença, mas de um sistema consolidado que, ao longo de décadas, tem resistido a sanções, manifestações internas e pressões internacionais — muitas vezes às custas da liberdade individual e da pluralidade política.

Com os recentes episódios de tensão entre Irã e Estados Unidos, como o ataque em junho de 2025, o papel dos aiatolás volta ao centro do debate mundial. Compreender quem são, como surgem e qual sua função ajuda a enxergar além da superfície religiosa: é uma chave para analisar os conflitos regionais, o avanço ou retrocesso de liberdades em sociedades islâmicas e os limites entre fé e poder no século XXI.

Em tempos em que as decisões de líderes religiosos podem impactar diretamente a segurança global, ignorar o poder dos aiatolás não é mais uma opção — é um risco.

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